O câncer é responsável por piorar a qualidade de vida, principalmente pela perda de massa magra, conhecida como caquexia, que pode ocorrer de forma acelerado entre esses indivíduos. A caquexia é um tipo de síndrome metabólica complexa que se caracteriza pela perda de massa muscular, com ou sem perda de gordura. Entre os pacientes com câncer, é extremamente necessário a manutenção da massa muscular, uma vez que sua perda pode piorar sintomas de quimioterapia e diminuir a expectativa de vida entre esses pacientes.
Alguns recentes estudos sugeriram que o ômega-3 poderia ser uma substância com efeitos protetores frente à caquexia em pacientes com câncer. Como dito em outras postagens, o ômega-3 é um ácido graxo poli-insaturado que está presente em alimentos de origem marinha (em maior quantidade) e em alguns óleos vegetais. Os principais componentes do ômega-3 são o EPA e DHA, que estão presentes nos alimentos de origem marinha, ao passo que o ALA está presente principalmente em óleos vegetais.
Diante das recentes descobertas que apontam para benefícios do ômega-3 em pacientes com câncer, tanto em sintomas de quimioterapia, quanto na manutenção de peso e massa magra, conduzi uma revisão sistemática e meta-análise que foi recentemente publicada na revista European Journal of Clinical Nutrition, uma das revistas mais conceituadas da nutrição e que faz parte do prestigiado grupo Nature.
A revisão sistemática foi composta por ensaios clínicos randomizados, estudos em que parte dos pacientes com câncer ingeriam ômega-3 e outra parte alguma substância para controle, normalmente um placebo ou algo sem relevância clínica. As buscas incluíram todos os estudos publicados na literatura científica, e foram realizadas em sete bases de dados (Pubmed, LILACS, Scielo, Scopus, Web of Science, Cochrane e Embase. Foram encontrados 14 estudos, dos quais quatro encontraram resultados estatisticamente significativos, ou seja, o ômega-3 ajudou a manter a massa magra nos pacientes com câncer, em comparação ao grupo controle.
Em nossas meta-análises, o ômega-3 promoveu um ganhou de 170 gramas nos pacientes com câncer, em comparação ao grupo controle, resultado que não foi estatisticamente significativo segundo os intervalos de confiança (0.17 kg; IC95%: -0.01; 0.35). Para o IMC, apenas cinco estudos forneceram dados suficientes. Os resultados também foram nulos e demonstraram que, em comparação a quem ingeriu um placebo, o ômega-3 não foi eficaz na manutenção ou ganho de massa magra. Por outro lado, para o peso corporal, encontramos um ganho de 260 gramas nos pacientes que ingeriram o ômega-3, ou algum de seus componentes, em comparação àqueles que estavam no grupo controle (0.26 kg; IC95%: 0.06; 0.45).
Os resultados encontrados foram promissores, porém ainda requerem cautela antes que o ômega-3 possa ser indicado para esse propósito. A grande heterogeneidade entre os estudos é um dos fatores que deve ser levado em consideração, uma vez que encontramos diferenças no tipo de controle que foi alocado aos pacientes, duração dos estudos, tamanho da amostra, doses de ômega-3 e qualidade metodológica dos estudos. Porém, visto que o ômega-3 é uma substância que possivelmente exerce alguns outros benefícios em pacientes com câncer, seu uso pode ser interessante, desde que combinado a outros tratamentos e sob recomendação de profissionais da saúde.
Para a população geral, o ômega-3 já foi comprovado ser eficaz no tratamento, ou complemento a outros tratamentos, de diferentes desfechos de saúde, que incluem diminuição dos sintomas de depressão, melhora no colesterol, prevenção de Alzheimer e, mais recentemente, publicado por mim e outros pesquisadores, redução dos parâmetros de diabetes. Em geral, as doses recomendadas ficam entre duas e quatro gramas de ômega-3 por dia. Porém, cada caso é um caso e a dose recomendada deve ser avaliada por um profissional capacitado.
Link para acessar o artigo: https://doi.org/10.1038/s41430-022-01100-x
Delpino, F.M., Figueiredo, L.M. Effects of omega-3 supplementation on lean body mass in cancer patients: a systematic review and meta-analysis. Eur J Clin Nutr (2022). https://doi.org/10.1038/s41430-022-01100-x